" cheira a bispo"
No início da década de 60, após ter finalizado a escolaridade obrigatória, a chamada quarta classe, resolvi que aquela pitoresca mas pequena aldeia, instalada no sopé da Serra da Ourada, concelho de Cabeceiras de Basto, já nada mais me podia assegurar, no que concerne à continuação de estudos e oferta de profissões, pese embora os meus pais, mais uma vez, tudo fazerem para que eu seguisse a sua profissão de alfaiates, o que só as minhas persistentes lágrimas de resistente os conseguiram demolir.
E foi assim que saí daquela casa que me viu nascer, mas nunca mais me viu viver, e fui para a casa da minha avó “Miquinhas”, mãe do meu pai, que vivia na “Bila” a cerca cinco quilómetros dali.
E ontem, ao ver e ouvir mais uns episódios sobre a igreja, agora relativos a alguns dos seus Bispos, fui transportado aos cheiros e sabores na casa da minha avó e recordar-me daquele dia em que senti aquele cheirinho a estrugido, tipicamente minhoto e perguntei à minha avó :
Avó, cheira tão bem, o que é? Ao que ela me respondeu que era o arroz que eu tanto gostava e que apelidava de “arroz da avó”, um arroz castanho, aveludado e de um sabor que só ela sabia fazer.
Mas quando fomos para a mesa, a minha avó, com um olhar triste e comprometedor, virou-se para mim e disse:
- Manel, hoje a tua avó descuido-se e o teu arroz ficou a “cheirar a bispo”.
- A cheirar a bispo? O que é isso, avó?
- É quando a comida, neste caso este arroz, fica “esturrado “, meio queimado e agarrado ao fundo.
Pois eu não sei se foi por ver os olhos tristes da minha avó, ou por tanto gostar daquele arroz, que nunca me soube tão bem!
Tudo isto vem a propósito de tanto se falar em Bispos nestes últimos dias, só que os cheiros que daí provêem não são envolventes, não são amigáveis, não são protectores, não são degustáveis e não são justos. É pena!